terça-feira, 22 de abril de 2008

Muito Pouco - Maria Rita

"Pronto
Agora que voltou tudo ao normal
Talvez você consiga ser menos rei
E um pouco mais real
Esqueça
As horas nunca andam para trás
Todo dia é dia de aprender um pouco
Do muito que a vida traz.
Mas muito pra mim é tão pouco
E pouco é um pouco demais
Viver tá me deixando louca
Não sei mais do que sou capaz
Gritando pra não ficar rouca
Em guerra lutando por paz
Muito pra mim é tão pouco
E pouco eu não quero (mais)
Chega!
Não me condene pelo seu penar
Pesos e medidas não servem
Pra ninguém poder nos comparar
Por que
Eu não pertenço ao mesmo lugar
Em que você se afunda tão raso
Não dá nem pra tentar te salvar...veja
A qualidade está inferior
E não é a quantidade que faz
A estrutura de um grande amor
Simplesmente seja
O que você julgar ser o melhor"

Maria Rita

domingo, 13 de abril de 2008

Cara valente - Maria Rita

Não, ele não vai mais dobrar
Pode até se acostumar
Ele vai viver sozinho
Desaprendeu a dividir...
Foi escolher o mal-me-quer
Entre o amor de uma mulher
E as certezas do caminho
Ele não pôde se entregar
E agora vai ter de pagar
Com o coração
Olha lá!
Ele não é feliz
Sempre diz
Que é do tipo Cara Valente
Mas veja só
A gente sabe...
Esse humor
É coisa de um rapaz
Que sem ter proteção
Foi se esconder atrás
Da cara de vilão
Então, não faz assim rapaz
Não bota esse cartaz
A gente não cai não...
Ê! Ê!Ele não é de nada
Oiá!!!Essa cara amarrada
É só!Um jeito de viver na pior
Ê! Ê!Ele não é de nada
Oiá!!!Essa cara amarrada
É só!Um jeito de viver
Nesse mundo de mágoas...
Não, ele não vai mais dobrar
Pode até se acostumar
Ele vai viver sozinho
Desaprendeu a dividir...
Olha lá!Ele não é feliz
Sempre diz
Que é do tipo Cara Valente
Mas veja só
A gente sabe...
Esse humor
É coisa de um rapaz
Que sem ter proteção
Foi se esconder atrás
Da cara de vilão
Então, não faz assim rapaz
Não bota esse cartaz
A gente não cai não..
Ê! Ê!Ele não é de nada
Oiá!!!Essa cara amarrada
É só!Um jeito de viver na pior
Ê! Ê!Ele não é de nada
Oiá!!!Essa cara amarrada
É só!Um jeito de viver
Nesse mundo de mágoas...
Ê! Ê! Ê! Ê!Ê! Ê! Ê! Ê!Ê! Ê!Ele não é de nada...

sábado, 12 de abril de 2008

Tempo Rei - Gilberto Gil

"Não me iludo
Tudo permanecerá
Do jeito que tem sido
Transcorrendo
Transformando
Tempo e espaço navegando
Todos os sentidos...
Pães de Açúcar
Corcovados
Fustigados pela chuva
E pelo eterno vento...
Água mole
Pedra dura
Tanto bate
Que não restará
Nem pensamento...
Tempo Rei!
Oh Tempo Rei!
Oh Tempo Rei!
Transformai
As velhas formas do viver
Ensinai-me
Oh Pai!
O que eu, ainda não sei
Mãe Senhora do Perpétuo
Socorrei!...
Pensamento!
Mesmo o fundamento
Singular do ser humano
De um momento, para o outro
Poderá não mais fundar
Nem gregos, nem baianos...
Mães zelosas
Pais corujas
Vejam como as águas
De repente ficam sujas...
Não se iludam
Não me iludo
Tudo agora mesmo
Pode estar por um segundo..."

Gilberto Gil

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Carta - Clarisse Lispector

Querida,
Não pense que a pessoa tem tanta força assim a ponto de levar qualquer espécie de vida e continuar a mesma. Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso - nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.
Nem sei como lhe explicar minha alma. Mas o que eu queria dizer é que a gente é muito preciosa, e que é somente até um certo ponto que a gente pode desistir de si própria e se dar aos outros e às circunstâncias. Depois que uma pessoa perde o respeito a si mesma e o respeito às suas próprias necessidades - depois disso fica-se um pouco um trapo.
Eu queria tanto, tanto estar junto de você e conversar e contar experiências minhas e dos outros. Você veria que há certos momentos em que o primeiro dever a realizar é em relação a si mesmo. Eu mesma não queria contar a você como estou agora, porque achei inútil. Pretendia apenas lhe contar o meu novo caráter, um mês antes de irmos para o Brasil, para você estar prevenida.
Mas espero de tal forma que no navio ou avião que nos leva de volta eu me transforme instantaneamente na antiga que eu era, que talvez nem fosse necessário contar.
Querida, quase quatro anos me transformaram muito. Do momento em que me resignei, perdi toda a vivacidade e todo interesse pelas coisas. Você já viu como um touro castrado se transforma num boi? Assim fiquei eu... em que pese a dura comparação... Para me adaptar ao que era inadaptável, para vencer minhas repulsas e meus sonhos, tive que cortar meus grilhões - cortei em mim a forma que poderia fazer mal aos outros e a mim. E com isso cortei também minha força. Espero que você nunca me veja assim resignada, porque é quase repugnante. Espero que no navio que me leve de volta, só a idéia de ver você e de retomar um pouco minha vida - que não era maravilhosa mas era uma vida - eu me transforme inteiramente.
Uma amiga, um dia, encheu-se de coragem, como ela disse e me perguntou: "Você era muito diferente, não era?". Ela disse que me achava ardente e vibrante, e que quando me encontrou agora se disse: ou esta calma excessiva é uma atitude ou então ela mudou tanto que parece quase irreconhecível.
Uma outra pessoa disse que eu me movo com lassidão de mulher de cinqüenta anos. Tudo isso você não vai ver nem sentir, queira Deus. Não haveria necessidade de lhe dizer, então. Mas não pude deixar de querer lhe mostrar o que pode acontecer com uma pessoa que fez pacto com todos, e que se esqueceu de que o nó vital de uma pessoa deve ser respeitado. Ouça: respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo o que você imagina que é ruim em você - pelo amor de Deus, não queira fazer de você mesma uma pessoa perfeita - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse o único meio de viver.
Juro por Deus que se houvesse um céu, uma pessoa que se sacrificou por covardia - será punida e irá para um inferno qualquer. Se é que uma vida morna não será punida por essa mesma mornidão. Pegue para você o que lhe pertence, e o que lhe pertence é tudo aquilo que sua vida exige. Parece uma vida amoral. Mas o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesma. Espero em Deus que você acredite em mim. Gostaria mesmo que você me visse e assistisse minha vida sem eu saber. Isso seria uma lição para mim. Ver o que pode suceder quando se pactua com a comodidade de alma.
Tua Clarice.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Alô liberdade - Chico Buarque

“Alô, liberdade
Desculpa eu vir
Assim sem avisar
Mas já era tarde
E os galos tão
Cansados de cantar

Bom dia, alegria
A minha companhia
Vai cantar
Sutil melodia
Pra te acordar

Alô, liberdade
levante, lava o rosto
Fica em pé
Como é, liberdade ...
Vou ter que requentar
O teu café

Bom dia, alegria
A minha companhia
Vai cantar
Em doce harmonia
Pra te alegrar”

Chico Buarque

quarta-feira, 9 de abril de 2008

O que te faz feliz? Arnaldo Antunes

“A lua, a praia, o mar A rua, a saia, amar…
Um doce, uma dança, um beijo
Ou é a goiabada com queijo?
Afinal, o que faz você feliz?
Chocolate, paixão, dormir cedo, acordar tarde
Arroz com feijão, matar a saudade…
O aumento, a casa, o carro que você sempre quis
Ou são os sonhos que te fazem feliz?
Um filme, um dia, uma semana
Um bem, um biquíni, a grama…
Dormir na rede, matar a sede, ler…
Ou viver um romance?
O que faz você feliz?
Um lápis, uma letra, uma conversa boa
Um cafuné, café com leite, rir à toa
Um pássaro, ser dono do seu nariz…
Ou será um choro que te faz feliz?
A causa, a pausa, o sorvete
Sentir o vento, esquecer o tempo
O sal, o sol, um som
O ar, a pessoa ou o lugar?
Agora me diz
O que faz você feliz?”

Arnaldo Antunes

terça-feira, 8 de abril de 2008

Papinho lírico no dia dos namorados - Carlos Drumond

"Dá licença?
Quero ser namorado a vida inteira
pois tenho uma reserva imensa
de ternurinhas e meninice arteira.

Quero brincar como nos primeiros dias
de namoreco sem declaração.
Curtir as pequeninas alegrias
como quem não quer nada de novo não
(mas quer, pois o homem não é mais simples que a mulher).

Pegar, é claro, nos teus dedos
só para ver como reagem
e, achando graça nos teus falsos medos,
murmurar: Coragem!

Fingir que me esqueci do combinado
no parque, para ver se sentes falta
de mim
e surgir da moita de capim,
com a minha calva luzidia e alta,
dizendo: Que engraçado!
Mas você por aqui, meu alfenim?

Ou me esconder atrás da porta,
miando que nem gato,
e continuar miando, já reconhecido,
a fazer o estranhíssimo relato
de que uma fada torta
me transformou num bicho assim todo encolhido.

Quero te dar bombons, e logo após
- o lalá! Ora veja!-
Pedir que me passes a cereja
de boca a boca: é mais gostosa
se a trincarmos a sós
enquanto os dedos vão tecendo
uma carícia lenta e silenciosa,
e tão eletrizante que só vendo.

Y otras cositas más que nem te conto.
ó minha sempre namorada,
mas decerto adivinhas este conto,
o mesmo de antes e a cada hora diferente
assim como é a gente
que se ama de antigo amor presente
e não se cansa e nem se vai cansar
de um certo suaviardente, antigo e encantador
namorador".

Carlos Drumond de Andrade